'Eu me sinto um ninguém na terra', diz babá sobre falta de direitos

'É como se eu não existisse', diz Aparecida Maria Silva Gama, de 49 anos.
Depois de 1 ano, Emenda das Domesticas segue sem regulamentação.

'Na prática, mudou só os horários', diz a doméstica Joana D’Arc de Oliveira (Foto: Flavio Moraes/G1)'Na prática, mudou só os horários', diz a doméstica Joana D’Arc de Oliveira (Foto: Flavio Moraes/G1)
“Eu me sinto um ninguém na terra. É como se eu não existisse.” A frase, da babá Aparecida Maria Silva Gama, de 49 anos, denuncia a sua revolta por não ter os mesmos direitos do que os demais trabalhadores, apesar de a Emenda Constitucional das Domésticas, promulgada há um ano e que ficou conhecida como "PEC das Domésticas", prever a igualdade dos benefícios para todos os profissionais.

A igualdade não veio porque a regulamentação que traria as regras para a aplicação da lei aguarda votação da Câmara.
Por enquanto, os domésticos não têm direito a obrigatoriedade de recolhimento do FGTS, a multa de 40% sobre o fundo em caso de demissão sem justa causa, seguro-desemprego, entre outros. De novos direitos já em vigor, a emenda trouxe aos domésticos apenas a jornada de trabalho de 8 horas diárias e 44 horas semanais e a hora-extra (eles já tinham garantidos, antes da emenda, direito um salário mínimo ao mês, recolhimento do INSS, férias e 13ª salário, por exemplo).
Aparecida Gama acha 'o cúmulo' não ter todos
os direitos (Foto: Flavio Moraes/G1)
Babá Aparecida Gama acha 'o cúmulo' não ter todos os direitos (Foto: Flavio Moraes/G1) O G1 conversou com Aparecida e outras domésticas que haviam sido ouvidas em 2013 – quando o clima ainda era de incerteza sobre as mudanças –, para saber como avaliam o cenário um ano depois da emenda.

“Eu acho o cúmulo. Praticamente não mudou nada. As empregadas domésticas continuam não tendo direito a nada”, disse Aparecida. “Quer saber? A pessoa trabalhar dez, 12 anos numa casa e não ter direito a nada? É um tempo perdido. É injusto, eu fico revoltada”, desabafou.
Para a doméstica Joana D’Arc Sousa Gomes de Oliveira, as mudanças também foram poucas.
“Na prática, mudou só os horários. Eu entro às 9h e saio às 18h20. Eu não trabalho sábado nem de domingo e se faço hora extra ela me paga. Antes, não tinha extra, não. Essa parte mudou”, disse. “Agora, FGTS, seguro-desemprego, isso aí, tinha que ser que nem todo mundo. Empregada doméstica acho que merece ter o seguro-desemprego”. “(Se eu for mandada embora) vou receber só o mês que eu trabalhei, eu não tenho direitos. E aí?”.
Joana conta que teve uma vida difícil na região de Irecê, na Bahia, que a impediu de terminar os estudos e conseguir um emprego que lhe ofereça todos os direitos.

“Na minha vida eu comecei a trabalhar com 13 anos, eu trabalhava olhando as crianças. Eu fui criada pela minha vó, sem meus pais. Fui criada quase sozinha. A gente trabalhava na roça, de agricultora. Era difícil”, desabafa. “Consegui estudar até a quarta-série, não tinha opção.”

Em São Paulo, com o emprego de doméstica, disse que a vida melhorou um pouco. “Eu criei meus três filhos”, revelou. Contudo, considera injusto não ter os mesmos direitos do que os demais trabalhadores.
“Eu queria que os representantes, o governo, agilizassem isso aí. Porque as empregadas domésticas também precisam de direitos. Na hora de votar eles ficam pedindo, fazendo promessa”
Joana D’Arc de Oliveira, doméstica
“Eu queria que os representantes, o governo, agilizassem isso aí. Porque as empregadas domésticas também precisam de direitos. Na hora de votar eles pedem, ficam pedindo, fazendo promessa.”
'A gente ganhou, mas não levou'
Na avaliação da diretora do Sindicato Empregadas e Trabalhadores Domésticos da Grande São Paulo, Eliana Gomes Menezes, o resultado até agora da emenda constitucional é “totalmente negativo”. E explica: “a gente ganhou, mas não levou. Quando saiu a aprovação da PEC a  promessa era que que em 90 dias seria regulamentado.”

De acordo com Eliana, até mesmo a questão da jornada de trabalho e das horas-extras pode não funcionar efetivamente, caso não tenha a boa vontade do patrão. “Tudo depende de provas, a empregada trabalha 15 horas, 16 horas, e tem patrão que ainda tem cara a pau de assinar o caderninho de ponto dizendo que trabalhou 8 horas. Se não tem um cartão assinado pelos dois, não tem como provar.”

A doméstica Cecília Jesus Silva, de 28 anos, por exemplo, mudou de emprego justamente porque a patroa anterior não estava cumprindo a regra da jornada de trabalho. “Eu estava trabalhando muito e não estava sendo valorizada”. Atualmente disse que encontrou um novo emprego, onde trabalha menos, e ganha mais.

Apesar da mudança, segue sem os demais diretos: “a gente trabalha do mesmo jeito, como todo mundo, a gente se sente injustiçada”, diz.

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